terça-feira, 7 de junho de 2011

O rock é mesmo pesado

Por Filipe Dias e Deborah Milhome


Um lugar escondido, nas entranhas de um prédio de aspecto abandonado. Este é o Zueira Vip, local em que o Movimento Independente de Rock e Cultura (Projeto MIRC) organizou o 17º Night Of Rock, que aconteceu no sábado, 28 de maio. O lugar fica no bairro Henrique Jorge, na rua Audízio Pinheiro, e funciona, de dia, como um pequeno shopping center.


Engana-se quem imagina que fazer um show é algo simples e recheado de glamour. As exigências de camarim e os ingressos vendidos com antecipação são privilégio de poucos. Para quem está começando, é exigido muito esforço para colaborar com as bandas da região, numa espécie de cooperativa, para que todas possam crescer juntas. Várias pessoas se mobilizam para que os artistas brilhem no palco e, geralmente, esses salvaguardas dos músicos passam despercebidos por quem acompanha o espetáculo.

A organização

O Projeto MIRC é um dos vários movimentos organizados que reúnem bandas de rock pelo Estado. Além deles, podemos citar a Cooperativa Underground do Bom Jardim (Cunder), e a mais conhecida, a Associação Cultural Cearense do Rock (ACR). Esta última é a organizadora do maior festival underground do Nordeste, o Forcaos, e ajuda, em parceria com a Prefeitura de Fortaleza, a organizar a Feira da Música.

Mas o MIRC, que surgiu por iniciativa de alguns jovens dos bairros Henrique Jorge e João XXIII em 2005, não busca, ou sequer cogita, apoio governamental. "Nosso intuito é promover a cultura do rock no Ceará e também prestar apoio a projetos sociais", defende Antônio Paulo, presidente do movimento. Paulo Underground, como é conhecido, foi um dos fundadores do Projeto, e se orgulha do status obtido. "Já organizamos mais de cinquenta shows, em alguns deles conseguimos colocar trezentas pessoas. Temos uma parceria com o Instituto Inespec [escola mantida por uma sociedade beneficente que ensina crianças com necessidades especiais], e, graças à webradio deles, podemos divulgar o som dos nossos parceiros".

O vice-presidente do Projeto MIRC, Renato Cícero, concedeu uma entrevista para o Notícias de Bastidor, descrevendo um pouco mais das dificuldades em organizar um show. Renato fala das superações que o projeto obteve ao longo dos anos, e da concorrência com outros produtores. Confira!



As bandas associadas ao projeto, quinze ao todo, não precisam pagar para fazer parte do MIRC. A colaboração se dá por venda de ingressos: cada grupo deverá vender uma cota pré-determinada. O planejamento dos eventos se dá através de reuniões, que ocorrem duas vezes por semana, e, nestas reuniões, são decididos os nomes de quem irá fazer o próximo evento. E é pelas mãos dos próprios membros que a divulgação é feita: um faz o cartaz, outro cuida das redes sociais... e assim vai, até o grande dia.

Montando o palco

O show começava às 19h, mas, duas horas antes, o Zueira Vip já estava movimentado. Pessoas carregando caixas de som, peças de bateria, instrumentos e luzes andavam de lá para cá, montando e desmontando, subindo e descendo escada...



É aí que o trabalho do roadie começa.

Roadie, para quem não sabe, é uma palavra em inglês que deriva de road. Significa, em tradução livre, aquele que vive pelas estradas, acompanhando uma banda (ou uma companhia de teatro, ou qualquer apresentação artística) onde quer que ela vá.

No Brasil, quem exercia esse trabalho era chamado de "bigu" que, em bom português, quer dizer caroneiro. Por isso, os roadies preferem que a sua função seja nomeada pela palavra estrangeira. "Passa mais profissionalismo", argumenta Edson Oliveira Leite, 22, um dos que trabalharam como roadie naquela noite. Ele participa do Projeto MIRC desde sua fundação, e, quando não está em cima dos palcos com sua banda, a Falácia, ajuda os colegas de movimento. "Eu não tenho nenhum ganho financeiro. Ajudo porque aprendo bastante, e porque isso é uma maneira de colaborar com a cena".

Acabou a montagem do palco, então é a hora dos engenheiros de som entrarem em ação. Eles precisam testar cada equipamento e equalizá-lo na mesa de som, para que o áudio das bandas saia o mais perfeito possível. É aí que a experiência como músico faz a diferença, segundo Edson. "Como a gente sabe o que esperar da aparelhagem, podemos pré-equalizar tudo, para, quando o músico chegar, ele poder adequar o equipamento ao som que ele tira", explica.

"Senhoras e senhores, com vocês..."


As luzes se fecham. A primeira banda testou todos os equipamentos e volumes, ou, como se diz no jargão musical, "passou o som". O público começa a chegar e a fazer barulho. E, quando o guitarrista dá o primeiro acorde, pode-se pensar: "acabou o trabalho dos roadies, agora é só esperar o show acabar"...

Ledo engano. A hora em que o evento começa é a mais importante. Os roadies precisam estar atentos e a postos para subir rapidamente no palco caso um microfone, caixa ou estante apresente defeito. "O cara tem que ser ágil. Quebrou a corda do guitarrista, você já tem que subir, com uma nova na mão, pro cara trocar. O show não pode parar, não", falou Edson.

Nesta noite do dia 28, nenhuma ocorrência. Os engenheiros de som e os roadies trocam ideias sobre as bandas em palco, comentando sonoridade e postura. Um deles preferia conversar sobre o regime comunista de Cuba, defendendo a posição castrista de manutenção do poder. "Os caras têm educação e saúde de primeiro mundo, como que eles podem estar piores que a gente?"

No mais, foi tudo tranquilo. As únicas pessoas que ficaram se mexendo o tempo todo foram os fãs de rock.

Banda Evernight (Foto: Divulgação/MIRC)

"...Obrigado, e até a próxima!"


Assim que essas palavras são pronunciadas, os organizadores, roadies e engenheiros de som correm para desmontar tudo. E também são nessas horas que o espírito de cooperativismo entra: todos ajudam a varrer e a desligar equipamentos, para que, já livres, possam fazer o apurado do caixa e pagar ao dono do som. O presidente do Projeto MIRC não quis citar valores exatos, mas admitiu que o custo de produção de um show como esse beira os R$ 1 mil. "Mas somos auto-sustentáveis. Geralmente dá para pagar o som e ainda conseguimos arrecadar fundos que nos ajudam a manter o projeto", diz Paulo Underground.

O foco passa a ser então o próximo evento, o 18º Night Of Rock, no dia 2 de julho, no mesmo local. E o rock pesado começa outra vez.

Nenhum comentário:

Postar um comentário